Ações na Rua / Street action
Encant’águas: mnemo-travessia ritual
[PT]
Convidamos a uma travessia no tempo e no espaço por caminhos de fluxos de águas invisibilizadas no espaço urbano de Lisboa. Esta ação performativa é inspirada nos percursos e ideias do engenheiro de minas português Luís Ribeiro (2017), nas visitas guiadas do projeto TEPe, em 2019, quando nos mostrou uma colina de Lisboa cujos fluxos das águas eram absorvidos pelo solo e mantinham a diversidade da vida sobre a terra. Com as construções civis, o curso das águas foi interrompido e ela, a água, é acusada de provocar danos à vida urbana, alagando ruas e avenidas. Quem atrapalha o fluxo de quem? O ativista indígena brasileiro Ailton Krenak nos lembra que somos 70% de água, entre outros materiais. A cosmovisão ameríndia nos convida à “escutar, sentir, cheirar, inspirar, expirar aquelas camadas do que ficou fora da gente como ‘natureza’” (2019). Propomos uma ativação sensorial por meio da evocação de memórias ancestrais das águas livres, conectando cidades do Brasil e de Portugal. Imagens, paisagens sonoras e experiências rituais são acionadas ao longo do percurso performativo que interliga quatro pontos de uma colina: Cisterna do Museu de São Vicente de Fora, Miradouro de Santo Estevão, Largo das Alcaçarias e Campo das Cebolas. Cantos mitológicos e de lavadeiras, histórias e memórias locais, sons de natureza viva compõem a paisagem sonora da ação performativa. A cada ponto demarcado na trajetória, uma videoarte é disponibilizada ao público através de QR Codes, acionados via telemóvel. Memórias passadas e ações do presente (reais e imaginárias) se misturam às imagens gravadas em trilhas poéticas que antecederam essa ação, através de imersões artísticas em duas cidades brasileiras (São Francisco Xavier e Águas de Lindóia). Como numa travessia onírica, corporificamos figuras encantadas e seres mitológicos, evocando as águas de profundezas, de nascentes, sulforadas e de imensidão, em um ritual de reencantamento e reavivamento dos fluxos aquíferos. Pacha é um conceito andino sobre a compreensão indissolúvel entre tempo e espaço. Tudo está interconectado, não havendo separação e hierarquia entre seres, passado, presente e futuro. O tempo flui em espiral e o futuro sempre se encontra com o passado, recriando-o. Invocamos a expressão aimará: “para caminhar adiante, há que olhar sempre para trás” (Solón, 2019). Essa proposta artística emergiu durante a pandemia do Covid-19, que interrompeu fluxos e evidenciou outras tantas interrupções já existentes nas cidades. Novos cantos de pássaros surgiram nas janelas, golfinhos reapareceram em praias urbanas, animais silvestres cruzaram praças e avenidas. Fluxos reativados pela redução brutal da ação humana. Menos presença humana, mais diversidade de seres vivos: uma equação que contraria a fúria de crescimento sem fim do capitalismo. A cidade, como quimera capitalística, tende à natureza morta, antropocêntrica que é. A pandemia é uma guerra invisível que faz agonizar o humano. Será que outros seres da Pacha Mama ainda querem conviver com humanos? Dizia Oswald de Andrade, em seu Manifesto Antropófago: “ao invés da equação eu parte do Cosmos, Cosmos parte do eu” (2011). Quantas memórias seguem soterradas no desenfreado modelo desenvolvimentista da urbe?
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[EN]
Enchantin'waters: ritual mnemowandering
We invite you to wander through time and space along old watercourse routes now invisible in the urban area of Lisbon city. This performative action is inspired by the routes and ideas described by the Portuguese mining engineer Luis Ribeiro (1955-2020), keeping in mind the guided tours of the TEPe project in 20 when he showed us a Lisbon hill whose water flows were absorbed by the soil and maintained the diversity of life on earth. In the face of the advance of building construction everywhere in the modern city, the watercourses behavior patterns have become severely disorganized, converting the hill watercourses guilty of causing damage to urban life, for provoking flooded streets and traffic disruption. Who gets in the way of whom? Brazilian activist Ailton Krenak reminds us that we are 70% composed by water, among other materials. Krenak amerindian worldview invites us “to listen, to feel, to smell, to inhale, to exhale those layers left outside of us as ‘nature’” (2019). We propose a kind of sensorial activation through the evocation of ancestral memories of those old free watercourses, glimpsing to connect cities of Brazil and Portugal. Images, soundscapes and ritual experiences are enabled along the performative wander, allowing to hang together four points of the hill: Cisterna do Museu de São Vicente de Fora, Miradouro de Santo Estevão, Largo das Alcaçarias and Campo das Cebolas. Mythological and washerwoman songs, local stories and memories, sounds of living nature make up the soundscape of the performative action. At each point marked out along the route, a video art becomes available to the public through QR Codes, accessed by mobile phones. Present actions and past memories (real and imaginary) are mixed with video footage and photos taken in poetic trails crossed through artistic immersions in two Brazilian cities (São Francisco Xavier and Águas de Lindóia). As a dreamlike wander, we embody enchanted figures and mythological creatures, invoking deep headwaters, sulphurous waters and their immensity, in a ritual of re-enchantment and resurrection of the old aquifer flows. Pacha is an Andean concept referred to the understanding of the indissoluble relationship between time and space. Everything is interconnected and it is impossible to state the detachment and hierarchy between beings, past, present and future. Time flows in a spiral, the future always meets the past, recreating it. We evoke the Aymara expression: “in order to move forward, you must always look back” (Solón, 2019). This artistic proposal emerged during the Covid-19 pandemic, a time of disrupted flows, a time that opened up the latent disruptions of the urban spaces. New birdsongs have been heard outside the windows, dolphins loomed on the water surface of urban beaches, wildlife mammals crossed urban squares and avenues. Natural flows have been reactivated by the brutal reduction of human action. Less human presence, more diversity of living beings: an equation that dismantle the fury of endless growth of capitalism. As a capitalistic chimera, the city directs itself towards the anthropocentric still life. The pandemic is an invisible war that makes the human a dying animal. Do the Pacha Mama creatures still want to live side by side with humans? In his Manifesto Antropófago, Oswald de Andrade warned: “instead of the formula I'm part of the Cosmos, Cosmos part of me” (2011). How many memories are still buried under the unbridled developmental model of the modern city?
Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Universidade Federal Fluminense (UFF) e Universidade de Lisboa (ULisboa)
[PT]
Líria Morays, Patricia Caetano e Thaís Gonçalves são artistas, pesquisadoras e professoras universitárias brasileiras no âmbito da dança que investigam a criação a partir de aspectos sensoriais e sonoros, estados corporais e improvisação nas suas relações entre corpo e ambientes naturais e urbanos. Compõem ainda a equipa: Juliana Rangel (ambiências sonoras), Claudia Marinho e Samanta Marinho (vestíveis), Sofia Soromenho (produção em Lisboa), Beatriz Cerbino (Foto-percurso), Mariana Rhormens e Milton Jesus (audiovisual) e Carla Cíntia Dutra (identidade visual).
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[EN]
Líria Morays, Patricia Caetano and Thaís Gonçalves are Brazilian artists, researchers and university professors in the field of dance who investigate creation from sensory and sound aspects, body states and improvisation in their relationship between the body and natural and urban environments. The team also comprises: Juliana Rangel (sound ambiences), Claudia Marinho and Samanta Marinho (wearables), Sofia Soromenho (production in Lisbon), Beatriz Cerbino (Photo-path), Mariana Rhormens and Milton Jesus (audiovisual) and Carla Cíntia Dutra (visual identity).
Duração total do evento / Estimated time
1h10
Participantes / Participants
Máx.15 – Inscrição obrigatória / Registration required
Dados móveis / Mobile data
Sim / Yes
Info prática: trazer telemóvel com dados móveis e auscultadores
Practical info: bring a cell phone with mobile data and headphones.
(Um assistente da organização fará o percurso acompanhado de um router móvel / An assistant from the organization will take the route accompanied by a mobile router)
Idioma / Language
Português / Portuguese
Local de encontro / Meeting Point
Largo de entrada do Museu / Igreja São Vicente de Fora