Ações na Rua / Street action

 

Bonito pra chover

 

[PT]

Três bailarinos, um fotógrafo e um videomaker refazem o percurso da linha férrea que passava pelos campos de concentração do Ceará (Brasil), onde milhares de pessoas foram encarceradas, em péssimas condições sanitárias, ou mortas durante as secas de 1915 e 1932.

Crato, Cariús, Senador Pompeu e Quixeramobim são cidades-chave do interior cearense que se conectavam à capital litorânea Fortaleza através da linha férrea que, à época, funcionava para o transporte de passageiros. Por este motivo, nos períodos das secas históricas, dezenas de milhares de camponeses de diversas partes do estado lotavam as estações de trem na esperança de chegar à capital, conseguir emprego e salvar-se da morte decretada pela seca infindável. No entanto, estas populações sertanejas não se enquadravam, na visão estatal, ao desejo de futuro à moda parisiense belle époque que se tinha para Fortaleza.

Para evitar que esses milhares de pretos, pardos, indígenas – em corpos magérrimos, vestindo farrapos, calçando sandálias quando muito – chegassem à capital, o Estado instalou naquelas cidades-chave e na periferia de Fortaleza enormes estruturas de cercamento. Estes lugares, chamados pelos jornais de "campos de concentração" e pela população de "currais grandes" ou "currais do governo", não tinham a mínima estrutura que garantisse a saúde e a dignidade das pessoas ali encarceradas. O povo era interceptado nos trens e nas estações e levado aos campos sob a promessa de receber alimento e ter um teto sobre suas cabeças. Tomando apenas os dados relativos à seca de 1932, mais de 70 000 pessoas foram aprisionadas nestes locais, incluindo milhares de crianças.

Partindo de Fortaleza, os artistas inverteram o percurso dos "flagelados" e foram aos municípios que abrigaram os campos de concentração. As viagens, o encontro e as conversas com o povo daquelas cidades, as visitas aos sítios históricos onde foram instalados os "currais do governo", a participação em pequenos e grandes eventos religiosos em memória dos que morreram naqueles locais, proporcionaram a realização de pesquisa coreográfica, cênica, dramatúrgica, fotográfica e audiovisual, incluindo registros documentais feitos pelos artistas. A travessia dançada e revivida nos leva a uma experiência histórica, imersiva e sensível.

"Bonito pra chover" é uma expressão utilizada popularmente pelo povo sertanejo e diz de um céu gris, de quando o tempo está nublado, carregado de nuvens, avisando que a chuva virá como um sinal de esperança. A instalação remonta memórias populares das chuvas e das secas no sertão do Ceará (Brasil), e levanta questões sócio-político-ambientais acerca da água e sua gestão, dos movimentos migratórios em massa, de religiosidade, crises climáticas e políticas genocidas.

"Bonito pra chover" conta com imagens produzidas pelos fotógrafos Allan Diniz e Levy Mota, a partir da viagem realizada em 2019 com os bailarinos Fabiano Veríssimo, Márcio Medeiros e Paulo José. Além de fotografias emolduradas e em lambe-lambe, compõe a exposição um videodança premiado pela produtora El ojo de Babel      e pelo Festival VideodanzaBa (Argentina), instalado sob uma tenda de lona plástica precária – não mais servindo a uma necropolítica de encarceramento em massa, mas justamente para lembrarmos do que jamais deve se repetir.

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[EN]

Beautiful to rain

 

Three dancers, a photographer and a videomaker retrace the route of the railway line that passed through the concentration camps in Ceará (Brazil), where thousands of people were imprisoned, in terrible sanitary conditions, or killed during the droughts of 1915 and 1932.

Crato, Cariús, Senador Pompeu and Quixeramobim are key cities in the interior of Ceará, which were connected to the coastal capital Fortaleza by the railway line that, at the time, was used for passenger transportation. For this reason, during periods of historic drought, tens of thousands of peasants from various parts of the state crowded the train stations in the hope of reaching the capital, finding work and saving themselves from the death decreed by the endless drought. However, these backwoods populations did not fit, in the state’s view, the desire for a future in the Parisian belle époque style that Fortaleza had.

To prevent these thousands of black, brown and indigenous people – in scrawny bodies, wearing rags, wearing sandals if at all – from reaching the capital, the state installed enormous enclosure structures in those key cities and in the outskirts of Fortaleza. These places, called "concentration camps" by the newspapers and "big corrals" or "government corrals" by the population, did not have the minimum structure to guarantee the health and dignity of the people imprisoned there. The people were intercepted on trains and in stations and taken to the camps under the promise of receiving food and a roof over their heads. Taking only the data for the drought of 1932, more than 70 000 people were imprisoned in these places, including thousands of children.

Starting from Fortaleza, the artists reversed the route of the "scourged" and went to the municipalities that housed the concentration camps. The journeys, the meetings and conversations with the people of those cities, the visits to the historical sites where the "government corrals" were installed, the participation in small and large religious events in memory of those who died in those places, provided the opportunity for choreographic, scenic, dramaturgical, photographic and audio-visual research, including documentary records made by the artists. The danced and relived crossing takes us to a historical, immersive and sensitive experience.

"Bonito pra chover" (Beautiful for it to rain) is an expression popularly used by the people of the sertanejo (backlands) and refers to a grey sky, when the weather is cloudy, laden with clouds, warning that rain will come as a sign of hope. The installation recalls popular memories of the rains and droughts in the sertão of Ceará (Brazil) and raises social-political-environmental questions about water and its management, mass migratory movements, religiosity, climate crises and genocidal policies.

"Bonito pra chover" features images produced by photographers Allan Diniz and Levy Mota, from the trip undertaken in 2019 with dancers Fabiano Veríssimo, Márcio Medeiros and Paulo José. In addition to framed and lambe-lambe photographs, the exhibition includes a videodance awarded by the production company El ojo de Babel and the VideodanzaBa Festival (Argentina), installed under a tent of precarious plastic canvas – no longer serving a necropolitics of mass incarceration, but precisely to remind us of what should never be repeated.

 

Allan Diniz (UFC)

[PT]

Artista audiovisual, fotógrafo e jornalista. Mestre em Comunicação – Fotografia e Audiovisual (UFC-Brasil), especialista em Linguagens e Mídias Digitais (Uni7-Brasil) com graduação em Comunicação (Unifor-Brasil). Atua internacionalmente como profissional freelancer conectando as áreas da comunicação, artes e tecnologia por meio de trabalho e pesquisa em audiovisual e fotografia.

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[EN]

Audiovisual artist, photographer and journalist. Master in Communication – Photography and Audiovisual (UFC-Brasil), specialist in Languages and Digital Media (Uni7-Brasil) with a degree in Communication (Unifor-Brasil). He works internationally as a freelance professional connecting the areas of communication, arts and technology through work and research in audiovisual and photography.

 

Levy Mota

[PT]

Mestre em Artes pela UFC (Brasil), é ator de teatro e, desde 2007, se dedica à fotografia da cena das artes vivas, já tendo trabalhado com/para dezenas de cias de teatro, dança e circo. No audiovisual, também atua como still, câmera e editor. www.cargocollective.com/levymota

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[EN]

Master in Arts from UFC (Brazil), he is a theater actor and, since 2007, he has been dedicated to the photography of the living arts scene, having worked with/for dozens of theater, dance and circus companies. In audiovisual, he also works as still, camera and editor. www.cargocollective.com/levymota

 

Duração total do evento / Estimated time

1h

Participantes / Participants

20 max. Incrições obrigatórias / Registration required

Dados móveis / Mobile data

Não / No

Idioma / Language 

Português / English

Local de encontro / Meeting Point

Largo do Rato