Entre pesquisa, ação e criação: o grupo Maracatu de baque solto “Leão de Ouro” (PE) em Lisboa
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O Maracatu “de baque solto”, também conhecido como Maracatu rural, é uma performance de música, dança e poesia, que decorre durante a época do Carnaval na Zona da Mata Norte Pernambucana (Brasil), e que pode reunir até 200 pessoas. Uma performance de Maracatu é uma festa de bairro, uma competição poética, um culto aos antepassados, um ritual de proteção da comunidade... “e muito mais”, como afirmam os habitantes dessa região.
Em dezembro de 2019, doze membros do Maracatu “Leão de Ouro de Condado”, grupo campeão de várias edições do Carnaval de Recife, foram convidados para vir a Lisboa no âmbito do projeto HELP-MD (“The Healing and Emotional Power of Music and Dance”), financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Além das experiências científicas de laboratório com os músicos e dançarinos de Maracatu, foi organizado um conjunto de atividades destinadas aos habitantes do bairro da Mouraria. Ao longo de uma semana de residência artística foram recreadas, na sede do Grupo Desportivo da Mouraria, as atividades que se realizam, na época do Carnaval, numa sede de Maracatu: fabricar um estandarte, costurar uma “fantasia”, ensaiar as “manobras” de dança (coreografias coletivas), “bater” nos instrumentos do “terno” (5 percussões), decorar “marchas” e “sambas” (versos improvisados em rima). Foi também organizado um encontro-conversa, aberto ao público, com os membros do Grupo Marchas Populares da Mouraria, que permitiu identificar os problemas e as aspirações comuns dessas duas práticas artísticas coletivas. Por fim, o artista pernambucano Hélder Vasconcelos (membro fundador de bandas de renome internacional como “Mestre Ambrósio”) foi convidado a ministrar uma oficina para músicos, atores e dançarinos, na qual os princípios básicos da música e dança do Maracatu foram reelaborados de forma livre e criativa.
Essas residências tomaram expressão num conjunto de ações performativas: desfiles de Maracatu, improvisações coletivas de música e dança, festas e apresentações públicas de criações artísticas individuais. Atuando com o corpo e o som “carnavalescos” no centro histórico de Lisboa, o nosso objetivo foi o de sensibilizar a população para os problemas atuais dessa zona da cidade (turismo de massa, gentrificação, privatização do espaço público, perda de lugares associativos, etc.). Nesta apresentação, produzirei algumas reflexões sobre os principais desafios dessas experiências, situadas na fronteira entre pesquisa científica, ação política e criação artística.
Filippo Bonini Baraldi (INET-md Universidade Nova de Lisboa - FCSH)
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Doutor em Etnomusicologia pela Universidade de Paris Nanterre. Lecionou na Universidade Paris 8, na Universidade Federal da Paraíba e na Universidade Nova de Lisboa. As suas pesquisas exploram a ligação entre música, emoção e empatia, segundo uma abordagem interdisciplinar. Publicou o livro Roma Music and Emotions (Oxford University Press, 2021).